sábado, 11 de fevereiro de 2012

Dica de leitura: Palha de Arroz - Fontes Ibiapina

 FONTES IBIAPINA.
Nascido em Picos, na zona rural, no lugar chamado "Vaca Morta", a 14 de junho de 1921, filho de Pedro de Moura Ibiapina e Raimunda Fontes de Moura, fez o primário em sua terra natal e o secundário em Teresina, bacharelando-se em Direito, em 1954, pela velha Faculdade da Praça Demóstenes Avelino. Ainda como estudante dedicou-se por algum tempo ao jornalismo. Findo o seu curso de Direito, entra logo para a magistratura, sendo juiz em várias comarcas do Piauí, a última em Parnaíba, onde publicava semanalmente artigos de crítica nos jornais, exercia o magistério, participava de toda a vida intelectual da cidade, e como tal ajudou a fundar a Academia Parnaibana de Letras e foi um dos seus presidentes.
Membro do Conselho Estadual de Cultura do Piauí e da Academia Piauiense de Letras, sua maior glória não está no magistério, no jornalismo ou mesmo na magistratura, e sim na literatura. Deixou uma grande obra, tanto em quantidade como em qualidade, em torno de 30 títulos. Talvez, por causa da complexidade do seu mundo pensado e escrito, os professores e estudantes não o têm procurado com freqüência para trabalhos acadêmicos, quer na área literária quer na de ciências sociais. Já não falamos dos críticos de jornais e revistas, que sumiram simplesmente, não existem mais. É uma pena, pois, que se deixe tão rico patrimônio inexplorado.
Depois de sua morte, teve apenas uma obra sua editada no Piauí: a Fundação Cultural Monsenhor Chaves publica o volume Crendices, Superstições e Curiosidades Verídicas no Piauí, em 1993. Trata-se de continuação de sua “Paremiologia Nordestina", de 1975, editado pelo Governo do Estado, através da Cia. Editora do Piauí. São adágios, rifões, brocardos, anexins, parêmias, máximas, ditados, expressões, comparações, relaxos, paleios, chulos, enfim toda uma riqueza do homem nordestino em sua criatividade de caboclo sem letras mas muitas vezes mais sabido que os doutores da cidade.
Na área literária propriamente dita saíram apenas dois folhetos – não seriam propriamente livros – divulgando contos de Fontes Ibiapina: um que reúne Trinta e dois e Tangerinos, em 1988, e outro com o conto inédito Dr. Pierre Chanfubois, sem data de publicação, mas que se atribui seja do ano seguinte. Ambos os opúsculos tiveram a chancela das Edições Corisco, do editor Cinéas Santos.
Fontes Ibiapina era uma pessoa alegre, recebia a todos muito bem, dava a impressão de ser feliz. Andou por muitas comarcas do Piauí, experimentou quando na Capital, antes de tornar-se magistrado, a indústria, quando sofreu um acidente. Mas nunca se queixava, sempre contando histórias, dizendo “chuleios”, incentivando a que os jovens escrevessem prosa. Só ficava brabo se o chamassem de poeta. Talvez porque houvesse experimentado a poesia e sentisse que não era o seu forte. Aliás, é difícil encontrar um prosador que não tenha feito poemas. Esses são alguns traços pouco conhecidos da vida de Nonon, como era conhecido na intimidade. Era um homem curioso, sempre atento ao que a ciência tinha para oferecer.
Faleceu no dia 10 de abril de 1986, na cidade de Parnaíba, onde exercia as funções de Juiz de Direito, depois de ficar, na noite anterior, horas e horas com uma luneta na mão para observar a passagem do cometa Halley.

  Obras :


Contos – Chão de Meu Deus, 1958 – 2ª ed. 1965

Brocotós, 1961
Pedra Bruta, 1964
Congresso de Duendes, 1969
Destinos de Contratempos, 1974
Quero, Posso e Mando, 1976
Eleições de Sempre e Até Quando, 1985
Romances – Sambaíba, 1963
Palha de Arroz, 1968
Tombador, 1971
Nas Terras do Arabutã, 1984
Curral de Assombrações, 1985
Vida Gemida em Sambambaia, 1985
Crônicas: – Mentiras Grossas do Zé Rotinho, 1977
Lorotas e Pabulagens de Zé Rotinho, s/d de publicação
Folclore: – Paremiologia Nordestina, 1975
Passarela de Marmotas, 1975
Teatro: – O Casório da Pafunsa, 1982.

Fontes Ibiapina foi um dos poucos escritores piauienses que a exemplo de Vítor Gonçalves Neto teve a coragem de transpor para a ficção os duros anos de repressão do período da ditadura Vargas quando comandava o Piauí o interventor Leônidas Melo, e Teresina, o prefeito Lindolfo Monteiro que no código de postura do município instituiu a proibição de construções de casas cobertas de palhas na zona urbana da capital.
Em Palha de Arroz, Fontes Ibiapina, nos traz a dimensão de uma Teresina provinciana, sem energia elétrica e marcada por incêndios criminosos contra uma parcela marginalizada da população. É o segundo romance a retratar uma Teresina urbana, antecedido por “Um Manicaca” (1909), de Abdias Neves.
Palha de Arroz traz cenas picarescas, mas carregadas de um drama peculiar aos párias nordestinos, notadamente quando apresenta o universo da prostituição como via de sobrevivência da maioria das mulheres que vivia nos bairros suburbanos da capital (se é que havia essa divisão entre urbano e suburbano numa Teresina que, embora tenha sido a primeira capital planejada do País, tinha sequer energia nos postes para iluminar as ruas) sendo os lampiões de azeite os únicos a cumprirem essa função e em pequena escala.
A publicação de Palha de Arroz tornou-se referencial para tratar de temas até então negligenciados pela literatura de autores piauienses e aprofundou o debate em torno da marginalização social. As personagens de Palha de Arroz foram de certo modo retrabalhadas com maestria em obras de mesmo viés como Beira Rio Beira Vida (1965) de Assis Brasil.





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